De madrugada, antes
do amanhecer, saí de Torre de Moncorvo e deixei o meu cavalo seguir o caminho assinalado pelas estrelas. Era um
animal raro, de origem oriental, com uma estrela branca na testa. Gostava de viajar
de noite, durante o dia, com bom tempo, à chuva e ao vento.
Li alguns livros
antigos de astrólogos persas, ou terei sonhado que os li, os quais acreditavam que os cavalos com aquela estrela possuíam
poderes ocultos que lhes permitiam comunicar com as estrelas e através delas
saber qual o caminho mais favorável para os fins de cada
viagem.
Estes cavalos
extinguiram-se na Pérsia há mais de dois mil anos. Os sacerdotes, por inveja, não gostavam do poder misterioso destes animais.
Por isso, reunidos em conselho, amaldiçoaram-nos e perseguiram-nos. Não demorou
muito tempo para que começassem a desaparecer. Antes disso alguns deles
refugiaram-se no Ocidente, onde se mantém a espécie.
Atrás de mim ia o meu
ajudante, chamado Botelho, com um jumento valente, mas um pouco enfermo por causa do reumatismo que lhe atacava uma
pata, especialmente durante aquele tempo da lua cheia.
O jumento tinha um
olho normal e outro amarelo com uma tonalidade próxima do açafrão, coisa misteriosa, cujo significado ninguém
sabia explicar, pois não havia memória de ter sido vista coisa semelhante. Não se tratava
de uma doença da vista que lhe diminuísse a visão. Pelo contrário, aquela vista era
saudável, maior do que a outra, alongada e brilhante, a qual lhe permitia ver claramente nas
noites escuras.
Naquele território,
que também abrangia Martim Tirado, havia o céu mais limpo que se conhecia. De noite viam-se com nitidez os astros, as
estrelas mais próximas e as mais longínquas, as maiores e as mais pequenas, as isoladas
e as agrupadas, as cadentes e as chuvas de estrelas. Nas noites de lua cheia, a cor azul
variável do céu, o branco das estrelas mais ou menos brilhantes e o amarelo da lua
davam-lhe uma lindeza que só ali se podia encontrar.
Astrólogos de terras
distantes viajavam até Moncorvo com a finalidade de subirem à sua Torre e dali observarem as estrelas, os astros e os
seus movimentos regulares e fazerem estudos e medições. Nas pedras do castelo deixaram
escritas algumas observações realizadas e gravuras das mesmas.
Também os adivinhos
daquele sítio e outros que vinham de longe subiam à Torre para observarem o voo dos corvos que ali habitavam, para
ouvirem o seu canto e depois predizerem o futuro sobre assuntos importantes.
Conto de António Júlio Lopes. Publicaremos os próximos capítulos ao longo das próximas semanas.
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